Os serviços públicos de rua
Eu ainda era menino , mas me lembro, da festa que era “o serviço público de rua”. A alegria que traziam as carroças de lixo, ainda puxadas a burro.Eu morava numa das primeiras casas da rua e sabia o nome de todos os burros que puxavam as carroças, e era lá que os garis faziam a ultima coleta do lixo.Na calçada da minha casa eles faziam a farra, pois era o último ponto.Eles dançavam e cantavam samba, batucando nos latões coletores de lixo, dando um verdadeiro show.Depois da habitual apresentação, eles olhavam para minha mãe, e diziam - ô madame, com todo o respeito, só faltava agora a senhora, dar para nós, aquela água bem geladinha, com bastante gelo, pois nos já demos o nosso espetáculo, senão amanhã a gente não volta, para recolher o seu lixo! –Sem falar dos outros serviços, de porta em porta, como o do peixeiro “Tião”, que trazia de tudo, camarões, peixes, siris, caranguejos.Contávamos também com o serviço do verdureiro , o senhor Manuel, que vinha com a sua carroça lotada de tudo muito fresquinho, porque naquela época, as feiras livres só se realizavam aos domingos. Tudo na carroça do seu Manoel era de alto zelo e muita qualidade.Tínhamos também a famosa “vaca leiteira” que trazia das vacarias o leite puro de melhor sabor e que ainda vinha quente das tetas das vacas. Sem nenhuma mistura de água, era o verdadeiro tipo “A”, que proporcionava a quem sabia fazer, uma manteiga excelente.O povo naquela época tinha um atendimento personalizado, e se por acaso, algum daqueles comerciantes, não dispusesse na hora do produto desejado pela dona de casa, ela podia se dar ao luxo de encomendar para o dia seguinte. Que tempo bom era aquele!.Na esquina da nossa rua, passava a principal via de acesso a antiga Rio São Paulo, a avenida Braz de Pina.Era a via turística existente, que nos levava para as cidades serranas, pois não tínhamos ainda a atual Avenida Brasil. Era por ali que passavam todos os ônibus que iam para Petrópolis e Teresópolis, assim como para o Espírito Santo, São Paulo, Bahia, e Minas Gerais.Por ali também transitavam os saudosos bondes elétricos, que faziam as linhas de Madureira e Vaz Lobo, transportando uma grande massa de trabalhadores e estudantes..Mas a minha alegria era mais forte, quando se iniciava a noite.Era o feliz momento de ver o velho trabalhador da iluminação das nossas ruas. - um alegre senhor, maduro e experiente - que trazia sempre uma pequena escada nas costas. Vinha acendendo as luzes da rua, que eram a gás de querosene, uma a uma, alongando assim um pouco mais os nossos dias.Outro grande sucesso, era o lindo cavalo branco, cujo dono era o “Sanam”, o mais famoso banqueiro de bicho da região, que tinha a casa mais bonita e rica da Rua. Com o jogo de bicho proibido, todas as vezes que a polícia vinha prendê-lo, ele gritava para o seu cavalo: - Garoto, olha a polícia!O cavalo vinha correndo para junto dele e ele de um só pulo montava, mesmo sem arreios e sela e saía correndo em disparada em direção a cancela de madeira que limitava a travessia da linha férrea.Ali “Garoto”, aquele lindo cavalo branco, dava um tremendo salto e atravessava a linha férrea, que era defendida por uma cancela.Assim o “Sanam” conseguia sempre escapar da prisão e da ação policial, deixando os policiais assustados e com caras de “brocoió” , como se chamava o bobo daqueles tempos.Toda a garotada vibrava feliz pelo desempenho daquele lindo cavalo, que mais se parecia com o cavalo Sylver do Zorro, o famoso herói do cinema americano.Mas a emoção da criançada era aguçada quase que diariamente, quando corriam as notícias de que o banqueiro de bicho “Sanam” iria se defrontar num duelo a bala, com o outro não mais famoso banqueiro, o contraventor “Arlindo Pimenta”, que atuava na região de Ramos, um outro bairro do velho Subúrbio da Leopoldina.Aquilo sempre cheirava a um bang-bang, do cinema americano, causando expectativas e movimentando o pacato mundo daquela época.Mas a guerra teve fim com o assassinato do “Arlindo Pimenta” por um dos capangas do valente rival, o banqueiro invencível, “Sanam”.
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