Lendo e ouvindo a música


Fofas


Desenhos de Jorge Queiroz da Silva

sábado, 17 de julho de 2010

Uma barbearia, uma notícia, um comentário e um silêncio total!

Era dia daquela faxina geral na aparência - barba, cabelo e bigode - e eu chegava à minha barbearia de sempre, a procura do meu pelador preferido.
Lá estava ele, como sempre bem ocupado e foi logo me dizendo pra’ sentar e aguardar, pois tinha três clientes na minha frente.
Pediu que eu tivesse paciência porque escolhia sempre o final de semana, quando ele estava com mais clientes.Sentei-me na única cadeira vazia e peguei um dos jornais que ali estavam para ler.
Naquele mesmo momento, o rádio ligado anunciava a fuga do bandido ELIAS MALUCO em Niterói. A notícia era complementada com o fato de que ele havia pago aos seguranças do xadrez, a propina de seiscentos mil reais, gerando um inquérito policial militar.
Prosseguindo sobre a notícia diziam que o bandido era o mesmo que havia executado o jornalista TIM LOPES, reduzindo-o a cinzas no tal forno micro ondas, lá na pedreira do COMPLEXO no morro do ALEMÃO.
A indignação tomou conta da minha cabeça fazendo com que eu dissesse em voz alta - ESTE PAIS NÃO PODE TER JEITO - Mais indignado eu fiquei, vendo que nenhuma das pessoas, ali presentes, disseram nenhuma palavra.
Até mesmo o meu barbeiro preferido que é uma pessoa muito falante, nada falou sobre o assunto, ele, que nunca me deixou sem resposta, não me dirigiu nenhuma palavra. Estranhei o comportamento de todos, ali presentes, mas como eu ali chegava naquela hora, poderia ser uma noticia repetida, e assim permaneci calado, mas notei o meu barbeiro, com os olhos arregalados me olhando, como se quisesse me dizer alguma outra coisa.
Aí então , o tal freguês que estava na cadeira do Joilson se levanta, e vem logo sentar-se ao meu lado.
E eu ali na espera da minha vez, continuava a ler o jornal do dia, calado. O tal elemento, então, sacou o seu telefone celular, e começou a falar em voz alta, para quem quisesse ouvir. Como o salão estava cheio, a platéia era grande.
Falava ele: - fulano, eu estou aqui com os meus amigos barbeiros, e tem dois deles que estão precisando tirar uma carteira de identidade com urgência urgentíssima, o que tu me diz a respeito disso? Sim, era exatamente, o que eu queria ouvir, ficam prontas em dois dias, e eu pego contigo, está bem assim? –
Olhando para os barbeiros, que encomendavam a tal carteira, completou: - QUEM PODE, PODE!
Eu lendo o jornal estava, e lendo o jornal fiquei. O tal sujeito ficou por ali rondando, todas as cadeiras da barbearia, e finalmente resolveu ir embora, despedindo-se do meu barbeiro.
Nessa altura, o Joilson, aguardou o tempo passar um pouquinho e olhando para mim disse: - o cara, ficou nervoso com o que tu disseste, e eu já estava nervoso também-
Então perguntei o porque e ele foi taxativo, esclarecendo que aquele cara era um policial civil e antes de eu comentar a notícia, ele havia falado para todos, como se tivesse se gabando, que dias atrás ele havia soltado um traficante e a grana tinha sido dividida, entre ele e o delegado, chefe dele, cabendo oitenta mil pra cada um !
O barbeiro ainda nervoso, falou de sua preocupação comigo quando comentei a notícia sob a forma de protesto e do seu medo quando ele saiu da cadeira, e em vez de ir embora, resolveu sentar-se ao meu lado.
Respondi ao Joilson que apenas havia falado uma verdade, lamentando que ficassem assustados, mas que a partir de então eu teria cuidado, com o que falasse em lugares públicos, pois as coisas estão cada vez mais doidas neste pais.
Confesso que tive um certo temor quando sai de lá e com muito cuidado fui para minha casa!

Um comentário:

  1. É isso aí, Jorge, uma total inversão de valores!
    Nós que estamos com a justiça e a verdade temos que ter cuidado com os bandidos que inclusive são pagos para nos proteger. Que horror!
    Um abraço.

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